Sempre gostei muito da história de Ester. É uma personagem que ainda hoje marca a minha vida com Deus e volta e meia penso nela. Podia ser apenas a história de uma mulher bonita que se tornou rainha, mas Ester foi muito mais do que isso. Um exemplo de resiliência, determinação, coragem, humildade, honra, sabedoria, estratégia... Uma mulher que tinha tudo para ser amarga, deprimida, revoltada. Uma mulher que era humana, limitada, certamente com muitos defeitos, mas que não deixou que o seu passado determinasse a sua identidade e ditasse o seu futuro.
O livro de Ester é muito rico e apesar de nunca mencionar o nome de Deus, podemos perceber a Sua ação do início ao fim da história. É assim também na nossa vida muitas vezes, não é? Quando Ele está em nós, às vezes mesmo sem mencionar o Seu nome, podemos percebê-Lo em acontecimentos, em conversas, em conselhos, até num abraço...
Há várias lições para a vida cristã no livro de Ester, recomendo que o leiam se ainda não tiveram oportunidade, mas hoje quero partilhar convosco alguns aspetos em particular presentes no capítulo 2, que me vieram à mente e ao coração durante as férias, enquanto conversava com o Pai.
Era uma vez uma menina judia chamada Hadassa. Depois de perder os seus pais, é adotada pelo seu primo Mardoqueu, um judeu da tribo de Benjamim, que tinha sido levado para o exílio pelo rei Nabucodonosor.
Hadassa era o seu nome de nascimento, mas na Pérsia a menina recebeu o nome de Ester. O nome Hadassa tem origem no hebraico Hadassah, derivado da palavra hadas, que quer dizer "mirto" ou "murta". Murta é um arbusto com origens na Europa e norte da África com folhas conhecidas por exalarem um cheiro agradável quando são esmagadas. Interessante, não acham? Quantas vezes temos sido esmagados pelas circunstâncias, tal como aquela menina. No caso dela a orfandade, o sair da sua casa, do seu conforto, de tudo o que conhecia, para ir viver num lugar estranho, educada num país que não era o seu, com uma língua e uma cultura que não era a sua, por um familiar que não era o seu pai. Ester foi esmagada, mas dela eventualmente exalou um cheiro agradável. Será que connosco tem acontecido o mesmo? Quando somos esmagados por situações que não podemos controlar, retirados do conforto e daquilo que conhecemos, o que revela o nosso coração? Tenho aprendido que a dor é necessária, mas ela precisa de ser processada e vivida, para chegar ao momento em que se transforma em cânticos de adoração. Nem sempre é fácil, mas tenho descoberto que o sofrimento é transformado quando conseguimos agarrar nele e depositá-lo aos pés de Deus. A nossa alma abate-se, mas se deixarmos, o bálsamo de Deus vem sobre nós e cura-nos.
Ester significa "estrela" e foi isso mesmo que a heroína da nossa história se tornou. Como uma estrela, ela brilhou apesar do seu passado. Ela iluminou apesar da sua dor. Ela dirigiu apesar das circunstâncias adversas. Será que conseguimos fazer o mesmo? Agarrar no nosso nome, na identidade que nos foi dada, muitas vezes tão diferente daquela que Deus nos deu, e transformá-la para a Glória Dele? Na nossa força dificilmente, mas em Deus, na força do Seu poder, certamente. Ele é o único capaz de transformar um passado cinzento num futuro brilhante.
Isto é um aparte, mas eu acho fantástica a importância que a Bíblia (e na verdade os judeus) atribui ao nome. Devíamos aprender com isto, afinal o nome é uma parte importante da nossa identidade. Inclusivamente vemos Deus mudar o nome de algumas pessoas como que marcando um antes e um depois na sua história. Recentemente fui pesquisar a origem do meu nome e descobri que afinal Diana não é só uma referência à deusa da caça, mas significa "divina" ou "aquela que ilumina". Muito melhor, não? (: Quando pensarem no nome dos vossos filhos tenham isso em consideração, lembrem-se que eles vão carregar essa identidade para o resto da vida.
Voltando à nossa história, e abreviando-a: o rei Assuero da Pérsia zangou-se com Vasti, rainha-consorte, e decidiu que ela já não era digna desse lugar. Repudiou-a, seguindo a sugestão dos seus conselheiros e decidiu arranjar outra mulher para o lugar.
O rei Assuero, ou Xerxes I como é historicamente conhecido, era herdeiro do maior império do seu tempo, o Império Persa e apesar de ser tido pelos relatos históricos, como um homem bonito para a sua época, era também um rei egocêntrico e até vingativo, de temperamento colérico e sensual.
Este rei manda então reunir todas as donzelas (virgens, leia-se) do reino e trazê-las para o palácio para uma espécie de casting. Aquela que lhe agradasse receberia o título de rainha. As outras, bom, digamos que não regressavam a casa... A poligamia e os haréns eram características comuns da cultura persa, pelo que, uma vez escolhida a rainha, as outras passariam a viver como concubinas do rei (Et 2:14) que é como quem diz escravas, sem grandes direitos, nem sobre o seu corpo, nem sobre os seus filhos.
Pelo que lemos em todo o livro parece-me claro que Ester foi ensinada a temer e a adorar a um único Deus, o Deus de Abraão, Isaac e Jacó. Mardoqueu tê-la-á ensinado a Lei do Senhor e os seus princípios e não devia ter em mente casá-la com alguém que não fosse igualmente judeu (apesar de estarem longe de casa), como era costume do seu povo. No entanto, os caminhos de Deus são mais altos do que os nossos e Ester tem agora o seu destino traçado. Se não fosse escolhida para ser rainha, os esforços de Mardoqueu na sua educação de pouco lhe serviriam, porque ela passaria a ser uma concubina. Podia ser até este o desejo de muitos naquele tempo, já que isso significaria viver no meio do luxo que a corte persa implicaria, mas um servo do Deus Altíssimo não desejaria isso para a sua filha.
É este contexto que temos, e é neste contexto que Ester chega ao palácio persa. Imagino a cena, a miúda devia estar em pânico, talvez com um misto de emoções, com curiosidade por conhecer o rei e a vida num palácio, claro, afinal ela era humana, mas ao mesmo tempo, com muito medo. Certamente com muita ansiedade, dúvida, desespero. Não sei, mas isto não é um conto de fadas malta, ela não foi ao baile qual cinderela a dançar com o seu príncipe encantado. Ela era uma jovem a ser tirada à força da família, mais uma vez... mais uma vez Ester era retirada do seu conforto, do seu lar e era colocada num meio estranho e hostil, cheio de intrigas e rivalidade. Só posso imaginar aquilo que ia na cabeça dela e no seu coração, o horrível conflito interior.
Quando a ordem do rei foi tornada pública, numerosas jovens foram levadas a Susa e reunidas no harém à guarda de Hegai. Ester encontrava-se entre elas. Hegai gostou muito daquela jovem e por isso lhe destinou imediatamente os produtos de beleza e alimentação especial e lhe deu sete das melhores empregadas da casa real, para a assistirem. Foram-lhe ainda dados os melhores aposentos do harém, para ela e para as suas empregadas. Ester 2:8,9
Ester causou uma boa impressão. Ela era esbelta e formosa (vs.7), mas certamente haveria mulheres igualmente bonitas no meio do harém, por isso acredito que foi mais do que a beleza que a destacou das demais. Já referi atrás a educação judaica de Ester. E, ao contrário do que possamos pensar, na época bíblica, as mulheres eram ouvidas, respeitadas e admiradas. Isso mudou mais tarde, mas havia mulheres profetisas e juízas. As mulheres tinham voz, tanto no campo privado como no público. (*) Então acredito que Ester fosse uma jovem educada, humilde no trato, ensinada a servir e a honrar, mas também uma mulher inteligente e com carisma.